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O socorro na orla costeira contou desde sempre com a intervenção dos bombeiros. Ao longo de décadas, as associações e corpos de bombeiros contaram com o apoio da Marinha, através do Instituto de Socorros a Náufragos (ISN), ou com meios próprios, adquiridos directamente, sem contrapartidas ou apoios oficiais. Nalguns casos, até antes do próprio aparecimento do ISN. |
Ao longo de décadas, os corpos de bombeiros do litoral e, mais recentemente, do próprio interior, foram formados por homens do mar, especialmente sensibilizados para as questões da segurança naquele meio e vocacionados para ali intervir, mercê dos conhecimentos e das experiências acumuladas.
Por isso, desde o início, o mar foi algo incontornável para muitas associações de bombeiros. Ciente da experiência ali acumulada, desde cedo o Estado entendeu sabiamente tirar partido disso através da Marinha/ISN. Até há alguns anos, foi uma parceria forte e eficaz, mas, com o andar do tempo, foi-se desmembrando e perdendo capacidade de resposta, por manifesta obsolescência do material e das próprias técnicas de intervenção.
Mesmo assim, os bombeiros foram mantendo o equipamento distribuído. Constava basicamente de material porta-cabos, para instalação fixa de cabos de vaivém para resgate de náufragos em navios encalhado junto à costa.
Este equipamento, como sabemos, rapidamente se tornou obsoleto, graças, por exemplo, ao recurso progressivo aos helicópteros. O ISN, entretanto, foi também atribuindo algumas embarcações semi-rígidas aos bombeiros, mas sem definir o futuro do restante equipamento porta-cabos.
A par disso, cientes da fraqueza desses meios e da falta de investimento do ISN - não por culpa própria, reconheça-se -, os bombeiros foram-se equipando com mais e melhores meios. Conhecedores das insuficiências económicas estatais, os bombeiros até chegaram a propor apoiar o funcionamento do próprio sistema de embarcações salva-vidas.
Estranhamente, essa disponibilidade foi sempre recebida com desconfiança, nalguns casos com desdém, e noutros com ironia. Ouvimos até dizer que, "se querem vir apagar fogos no mar, então está na altura de nós irmos apagá-los em terra".
Esteve então em causa a possibilidade de se dotar o nosso litoral com uma embarcação salva-vidas transoceânica com características especiais, ainda inexistente em Portugal. O projecto acabaria por abortar por manifesto desinteresse da Marinha.
Ultimamente, o ISN informou as associações de bombeiros de que, como aconteceu, não iria renovar os seguros das viaturas que lhes estavam atribuídas, confirmando assim o desinteresse na utilização desses meios. E o impasse mantém-se sem qualquer evolução, a não ser o facto do ISN, nalguns casos, já ter retirado das associações as viaturas e equipamentos que lhes estavam atribuídos.
Quando, há anos, os bombeiros foram pioneiros no recurso às motas de água para socorro no mar, o ISN não pôde, ou não quis, acompanhar essa evolução. Fê-lo mais tarde, adoptando, afinal, os mesmos meios, mercê de apoios com que os bombeiros não puderam contar na generalidade, apesar de serem credores do esforço financeiro e humano pioneiro realizado.
Pelas mesmas razões do passado, a disponibilidade dos bombeiros para apoiar o socorro no mar continua a ser uma realidade, mas os resultados disso estão muito aquém do desejo dos próprios bombeiros.
Para dar a volta a isso, importa que quem tutela essa área defina claramente o que quer dos bombeiros. E que estes, pela experiência acumulada e pela capacidade de resposta instalada, também possam dizer de sua justiça.
Rui Rama da Silva, Director do Jornal "Bombeiros de Portugal"
Fonte: Texto publicado na edição de Outubro do jornal "Bombeiros de Portugal" da Liga dos Bombeiros Portugueses
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